Por Lula Branco
Martins
Vinte personalidades, entre várias
outras, cariocas de nascença ou por paixão, que morreram entre os anos de 1991
e 2011.
Jorginho Guinle
Playboy: 5/2/1916 -
5/3/2004
→ Ele nasceu milionário, tornou-se
herdeiro de um império, viveu o melhor que a vida podia oferecer, nunca
trabalhou e foi gastando toda a sua fortuna até terminar seus dias praticamente
pobre. Famoso aqui e lá fora, em um tempo em que não existia a categoria
celebridade, namorou estrelas de Hollywood, como Ava Gardner e Rita Hayworth.
Sobrinho do fundador do Copacabana Palace, onde morava, apaixonado por jazz,
ele simbolizou como poucos o glamour dos anos 40 e 50 no Rio.
Emilinha Borba
Cantora: 31/8/1922 -
3/10/2005
→ Carioca da Mangueira, Emília
deu muito trabalho à mãe: as duas brigavam sempre que a garota saía de casa
para se apresentar em programas de auditório. Mas seu caminho era esse. Ainda
muito nova, ela já cantava para Ary Barroso ouvir (O X do Problema foi o
sucesso daquela fase, e Chiquita Bacana, o maior deles). Fez de tudo um pouco:
gravou marchas, interpretou personagens infantis em musicais de Braguinha,
contracenou com Carmen Miranda no cinema e tornou-se conhecida por ter
conquistado, na época áurea do rádio, o título de “a favorita da Marinha”, em
contraponto à cantora Marlene, queridinha da Aeronáutica. No Maison de France
está em cartaz um musical que conta a história desta que talvez tenha sido a
primeira rivalidade de marketing da vida artística do Brasil.
Renato Russo
Cantor e compositor: 27/3/1960
- 11/10/1996
→ Fundador da banda Legião Urbana
e autor de alguns dos maiores clássicos do rock brasileiro, como Tempo Perdido,
Pais e Filhos, Eduardo e Mônica e Geração Coca-Cola, Renato Manfredini Júnior
(carioca que morou em Brasília na juventude) foi uma das principais cabeças
pensantes de sua geração. Visto como guru pelos adolescentes dos anos 80, era
tímido no tratamento pessoal, mas costumava discursar de forma exaltada em shows. Nas letras, podia
tanto falar da situação política do país como abordar grandes temas da condição
humana. Sua veia mais romântica ficou registrada em canções como Vento no
Litoral. Abalou as rádios em 1987, com Faroeste Caboclo, um folk-rock trágico
de nove minutos de duração. Homossexual assumido, teve um filho com uma fã.
Morreu jovem, aos 36 anos, em consequência de complicações causadas pela aids.
Bussunda
Humorista: 25/6/1962 -
17/6/2006
→ Mais popular e mais irreverente
integrante do grupo Casseta & Planeta, Bussunda morreu fazendo piada. Era o
seu trabalho. Ele participava da cobertura da Copa de 2006, na Alemanha,
quando, com 43 anos de idade, sofreu um ataque cardíaco durante o café da manhã
no hotel. Havia iniciado a carreira muito jovem, como redator da revista
Casseta Popular, que inaugurou na década de 80 um novo estilo de humor,
ultrapassando os limites do politicamente correto e dando de ombros para
qualquer tipo de ideologia. Anos mais tarde, Cláudio Besserman Vianna, seu nome
verdadeiro, seria figura-chave por trás do humorístico TV Pirata e emplacaria
uma carreira de sucesso na TV Globo.
Betinho
Sociólogo: 3/11/1935 -
9/8/1997
→ Sobrancelhas graúdas que mal
lhe cabiam no rosto, olhos claros a enfeitar uma expressão quase sempre serena,
Herbert de Souza foi um dos principais nomes na luta pela justiça social no
país. Fundou o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase),
dedicando-se a campanhas como a Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e
pela Vida. Nos anos 90, sua popularidade era tanta que costumava ser aplaudido
de pé ao entrar num teatro ou em bares. Mineiro de Bocaiuva, exilou-se durante o
regime militar. Hemofílico como o cartunista Henfil e o violonista Chico Mário,
seus irmãos, Betinho morreu vítima do vírus da aids, contraído numa transfusão
de sangue.
Tom Jobim
Compositor: 25/1/1927
- 8/12/1994
→ Pianista, arranjador e maestro,
Antonio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim foi o maior compositor da bossa
nova. São de sua autoria canções como Corcovado, Wave e Samba do Avião − além
do marco inicial do movimento, Chega de Saudade, esta assinada em dupla com
Vinicius de Moraes e eternizada pela voz e pelo arranjo do cantor João
Gilberto. Também com Vinicius compôs Garota de Ipanema, uma das músicas
brasileiras mais conhecidas no exterior. Boêmio inveterado, mesmo assim às
vezes acordava bem cedinho para curtir as árvores e os passarinhos do Jardim
Botânico. Foi um sujeito 100% carioca: fez show na praia, ia à quadra da
Mangueira e, ironia suprema, seu nome acabou vinculado ao Galeão, que, depois
que ele morreu, passou a ser chamado de Galeão-Tom Jobim. É dele a frase “A
única saída para o Brasil é o aeroporto”.
Tim Maia
Cantor e compositor: 28/9/1942
- 15/3/1998
→ O rei da soul music nacional
teve uma infância dura, vivida na Tijuca, onde entregava quentinhas preparadas
pela mãe, cozinheira. No fim dos anos 50, com 17 anos, participou de uma banda
de rock ao lado de Roberto Carlos. Nenhum dos dois era famoso na época e assim
eles se mantiveram por bom tempo: nada de sucesso. O Tim compositor só ganharia
seu espaço em 1969, quando o rei (a essa altura já coroado) gravou Não Vou
Ficar, de sua autoria. E o Tim cantor, de vozeirão, suingue e manias
inconfundíveis (“mais grave, menos eco…”), estouraria no ano seguinte, com
Primavera, uma das canções mais conhecidas de seu repertório, ao lado de Não
Quero Dinheiro, Me Dê Motivo e Vale Tudo. Esta última dá título a uma peça, em
cartaz no Rio, sobre sua vida e trajetória artística, estrelada por Tiago
Abravanel. O “síndico” (como o chamava o colega Jorge Ben Jor) da música
brasileira morreu por complicações cardiorrespiratórias, após passar mal
durante um show, em Niterói.
Paulo Gracindo
Ator: 16/7/1911 -
4/9/1995
→ Aquele personagem era tão
forte, tão marcante que sua imagem, lapidada nos anos 70, será para sempre
associada ao próprio ator. Estamos falando de Odorico Paraguaçu (o “bem-amado”
da ficção) e de Paulo Gracindo (que o interpretava). Nascido Pelópidas, e já
houve quem o chamasse de “seu Petrópolis”, ele cresceu em Maceió e ainda jovem
se mudou para o Rio, onde queria tentar uma carreira no rádio ou no teatro.
Conseguiu. Teve um programa só dele na Nacional e, no humorístico Balança Mas
Não Cai, criou o Primo Rico, que sempre desdenhava do Primo Pobre (vivido por
Brandão Filho). Esteve em novelas como Gabriela e Rainha da Sucata.
Maria Lenk
Nadadora: 15/1/1915 -
16/4/2007
→ A imagem que todos guardamos da
atleta é certamente aquela em que já era uma senhora, velhinha, dando lições de
vida em telejornais.
Mas sua história vai muito além dos campeonatos para a
terceira idade. Descendente de alemães, paulistana que escolheu o Rio para
viver, Maria Emma Hulga Lenk Zigler tornou-se o primeiro expoente da natação
brasileira quando estabeleceu o recorde mundial dos 400 metros em estilo
peito, em 1939. Na década seguinte iniciou a carreira de técnica
“rigorosíssima” nas piscinas. Morreu de infarto após um treino. Seu nome hoje
batiza o parque aquático que foi erguido para o Pan de 2007, no Recreio.
Zózimo Barrozo do Amaral
Jornalista: 29/5/1941
- 18/11/1997
→ Filho de magnata, transformou o
colunismo social. Com ele, as notinhas curtas ganharam alma, graça e
inteligência. Em sua página no Caderno B do Jornal do Brasil, trocava
coberturas de festas por informações sobre os donos do poder e os bastidores da
política, com finas tiradas e reflexões bem-humoradas sobre a vida carioca e
brasileira. Uma de suas marcas era aquela frase que praticamente intimava o
leitor a seguir: “E o Fulano, hein?”. Em 1993, trocou o JB por O Globo. Era
apaixonado pelo Flamengo, pelo tênis, pela boa mesa, por bebidas, por seus
amigos e pelo Rio de Janeiro. Morreu de câncer no pulmão, em Miami.
Cássia Eller
Cantora: 10/12/1962 -
29/12/2001
→ Figura feminina mais importante
do rock brasileiro na década de 90, Cássia morreu aos 39 anos, quando estava no
auge. No início de 2001, tinha participado do Rock In Rio III e, pouco antes,
havia gravado um CD acústico que obteve sucesso de vendas - desde que surgiu
foi incensada pela crítica, mas custou a atingir o grande público. Carioca com
passagem por Brasília, roqueira com atitude de roqueira e voz grave
reconhecível à distância, era boa intérprete tanto para os lamentos de Cazuza
como para as delicadezas de Nando Reis. Exagerada nos shows, com intensa
presença de palco, podia tirar a blusa ou fingir jogar o instrumento longe.
Teve um filho com um de seus músicos e, na época em que saiu de cena, vítima de
infarto, dividia seu apartamento em Laranjeiras com uma companheira.
Roberto Campos
Economista: 17/4/1917
- 9/10/2001
→ Desde os anos 60 ele já
pregava: a economia brasileira caminhará para trás sempre que se optar por
processos de estatização. Pensador brilhante, dono de um texto claro e irônico,
defensor aguerrido do mercado aberto e da livre iniciativa, foi deputado e
senador pelo PDS, partido de situação na década de 80. Tinha trânsito com
governantes de qualquer linha. Na era Vargas, criou o Banco Nacional de
Desenvolvimento (então BNDE). Com JK, traçou o Plano de Metas. Com Castelo
Branco, ajudou a derrubar a inflação no início do regime militar. Em 1989,
apoiou a campanha de Collor, mas três anos depois votou a favor de seu
impeachment, e aí foi aplaudido de pé.
Braguinha
Compositor: 20/3/1907
- 24/12/2006
→ Carlos Alberto Ferreira Braga
foi homem de dois apelidos (Braguinha e João de Barro) e de múltiplos talentos.
Para começo de conversa, trata-se do autor da letra de uma das mais populares
canções brasileiras, o samba-choro Carinhoso, ao lado de Pixinguinha. Com Noel
Rosa, compôs um clássico dos bailes, As Pastorinhas. Trabalhou como dublador em
filmes da Disney e escreveu temas infantis, acondicionados, nos anos 60 e 70,
na Coleção Disquinho. Quem de 40 e poucos anos consegue se esquecer do Macaco
Simão, do Pequeno Polegar e de Dona Baratinha? Pois é, é tudo dele.
Jamelão
Cantor: 12/5/1913 -
14/6/2008
→ Durante décadas, a voz oficial
da escola de samba mais popular da cidade foi a de Jamelão. Nascido José Bispo
Clementino dos Santos, ele acompanhou a ascensão da Estação Primeira de
Mangueira, tornando-se seu intérprete principal a partir dos anos 50. Não
gostava do rótulo de “puxador” e brigava com repórteres que o abordavam falando
dessa forma. Gravou canções como Folha Morta e Matriz ou Filial, mas foi no
meio do samba-enredo que ganhou fama. Fizeram sucesso na sua interpretação o
refrão do “xinxim e acarajé”, de 1986, e a letra em tributo a Chico Buarque, do
desfile de 1998. No último título da Verde e Rosa, em 2002, ainda era ele quem
cantava, tanto no CD como na avenida.
Dora Bria
Windsurfista: 19/7/1958 - 22/1/2008
→ Carioca típica, que gostava de
sol e de mar, Dora morreu aos 49 anos, em um acidente de carro. Chegou a se
formar em engenharia química, mas era, desde garota, fã de esportes aquáticos,
como iatismo e windsurfe - foi pegando onda que conquistou campeonatos no
Brasil e no exterior, fazendo nome até no Havaí, entre as ondas gigantes do
arquipélago americano. Musa em sua modalidade e fora dela, posou para ensaios
em revistas masculinas e apresentou programas de TV. Foi o velejador Lars
Grael, medalhista olímpico e grande amigo, o primeiro a ser informado da
tragédia: seu nome e seu telefone foram encontrados numa agenda, no meio das
ferragens.
Mário Lago
Ator: 26/11/1911 -
30/5/2002
→ Chamamos Mário de ator apenas
para simplificar as coisas. Mas a palavra realmente não comporta tudo o que ele
fez, e foi. Primeiro, o que poucos sabem é que trabalhou como advogado. Atuou
em cinema, rádio, novelas (é sempre lembrado por um de seus mais tocantes
papéis na maturidade, em O
Casarão ) e compôs dois sambas que todo mundo sabe de cor: Ai,
que Saudades da Amélia e Atire a Primeira Pedra, ambos com Ataulfo Alves.
Militante comunista, sua vida diz muito sobre a cultura, a boemia e o jeito de
ser do carioca.
Waldir Amaral
Radialista: 17/10/1926
- 7/10/1997
→ Quando um profissional de rádio
cria um bordão que se torna famoso, é festa. O que dizer então de um radialista
que inventou dezenas deles? Craque nas transmissões de futebol (numa época em
que, na Globo, narrava apenas um tempo da partida, e o brilhante Jorge Cury o outro),
Amaral tinha voz anasalada e estilo sereno. Dizia frases como “O relógio marca”
Para informar o tempo do jogo, “Tem peixe na rede” sempre que o placar mexia e
“Indivíduo competente” ao revelar o nome do artilheiro. Não era unanimidade:
reclamava-se que era lento demais e que gritava gol depois da hora.
Barbosa Lima Sobrinho
Advogado, jornalista
e escritor: 22/1/1897 - 16/7/2000
→ Único integrante destas páginas
de saudade que nasceu no século XIX, Barbosa vivia em meio a livros, teses,
documentos, petições − enfim, em meio à história do Brasil. Escreveu sobre ela
e dela fez parte. Iniciou seus estudos no Recife, mudando-se para o Rio nos
anos 20, para escrever no Jornal do Brasil. Sua retidão e seu prestígio o
levaram a presidir a Associação Brasileira de Imprensa por várias vezes. Em
1979, participou ativamente da campanha pela anistia e, em 1992, foi o primeiro
signatário do pedido de impeachment do presidente Collor. Teve cadeira na ABL
e, poucos meses antes de morrer, aos 103 anos, foi enredo da escola de samba
União da Ilha.
Roberto Marinho
Jornalista e
empresário: 3/12/1904 - 6/8/2003
→ Tido como um dos homens mais
poderosos do país, e presidente das Organizações Globo por décadas, este
empresário da comunicação herdou do pai, Irineu, o jornal O Globo, fundado em
1925. Tomou para si a incumbência de, a partir daí, construir um império, que
hoje reúne emissoras de TV e de rádio, vários veículos de mídia impressa e
portais digitais. Sua principal criação foi a Rede Globo, surgida em 1965 e que
em poucos anos se tornaria líder de audiência no país. Tinha adoração por
cavalos, gostava de festas e se casou, pela terceira vez, com quase 90 anos,
com a socialite Lily de Carvalho.
Mario Henrique Simonsen
Engenheiro e
economista: 19/2/1935 - 9/2/1997
→ Este carioca que tinha o hobby
de cantar óperas e conhecia profundamente música erudita − sobre a qual escreveu
várias críticas para VEJA − respondeu durante anos, no regime militar, pelos
acertos e desacertos da economia nacional. Durante sua gestão na Fazenda,
enfrentou um leão que ao fim e ao cabo nunca conseguiu domar: a inflação.
Simonsen foi professor da FGV e, tanto na sala de aula como na Esplanada e em
seus artigos, defendia a tese de que o controle dos preços só pode acontecer se
for sustentado por três pilares: o equilíbrio fiscal, uma política de renda
controlada e, sempre que necessário, a reformulação da moeda do país.
Veja Rio, setembro de
2011.
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