terça-feira, 21 de novembro de 2017

Histórias de Paraquedistas XXV

A maior tragédia ocorrida do Regimento Santos Dumont

Hoje, 26° Batalhão de Infantaria Paraquedista

Numa instrução realizada no dia 10 de março de 1966, no RSD, no anfiteatro da 2ª Cia, defronte à cadeia, tendo como monitor o 3° Sgt Jorge Mendonça de Carvalho, Pqdt 1135, do 1954/1 e MS 414, uma granada de boca de fuzil explodiu no meio dos recrutas. Morreram, além do instrutor, oito soldados e dezenas ficaram feridos e mutilados.


Falecidos no acidente;

3º  Sgt Jorge Mendonça de Carvalho  (02/09/1925 - 4/3/1966)
Sd Carlos Alberto Sandoval                (12/07/1947 - 4/3/1966)
Sd Edir Franklin de Brito                    (27/12/1947 - 4/3/1966)
Sd Jorge Oliveira  Duarte da Motta     (24/09/1947 - 4/3/1966)
Sd José Silva Moreira                          (22/03/1947 - 4/3/1966)
Sd José Henrique Casanova Mazzei    (21/02/1947 - 4/3/1966)
Sd Nelson Pitão Júnior                         (17/08/1948 - 4/3/1066)
Sd Roberto Fernandes Pereira              (10/12/1947 - 4/3/1966)
Sd Walmir e Silva                                 (28/10/1945 - 4/3/1966)

*Todos os soldados foram brevetados pós-mortem.

Testemunho de quem estava lá no dia do acidente:

Nesse dia, eu estava tendo uma instrução com Sgt Lima Vieira, no Bosque dos Campeões, quando fomos surpreendidos com a explosão. Ao vermos vários soldados correndo pelo pátio, em frente à quadra, foi que nos demos conta da gravidade do acidente. Eram soldados ensanguentados, alguns atingidos no rosto, e que, posteriormente, perderam a vista. O Comandante era o Tenente Coronel Pamplona, que deu ordem para que os feridos fossem levados para o Hospital Carlos Chagas, onde vi uma carreira de soldados mortos, e, posteriormente, para o Hospital Barata Ribeiro, em Mangueira. O Sd Roberto Fernandes Pereira estudou no mesmo colégio que eu, e eu o vi morto no Hospital Carlos Chagas junto com os outros. Foi realmente um acidente terrível.

Sérgio de Oliveira Matos, Pqdt 10919  1963/9  MS 1562

Eu cursava o CFS (Curso de Formação de Sargentos) realizado no REsI. (Regimento Escola de Infantaria) e fui incumbido de entrar em contato com a esposa dele, comunicando que ele (3° Sargento Jorge Mendonça de Carvalho), seria o patrono da nossa turma.

Clarival Vilaça, Pqdt 10313  1963/4

O Cabo Soares, hoje Capitão da Reserva, naquela ocasião estava auxiliando na instrução. Foi chamado na Cia para resolver um problema de serviço, quando estava regressando para o local da instrução, a granada explodiu.

Não sei se vocês recordam, e para outros que ainda não tem conhecimento do ocorrido, era uma instrução de granada de bocal usada no cano do mosquetão. Não sei se estava com ou sem a proteção do disparo, caiu no chão (terra batida), ocasionando a explosão. Tanto o sargento como os demais soldados sofreram mais pelo deslocamento do ar, tendo os seus corpos abertos. Os demais, como estavam em um anfiteatro, receberam estilhaços. Muitos foram atingidos nos olhos e nos órgãos genitais. Do outro lado da rua, ficava o xadrez, havia pedaços de peles coladas na parede. Foi um momento dramático e triste.

José Alfredo Stron Nunes, Pqdt 11361  1964/2

Fiz o Curso de Cabos (CFC/65) com o Sargento Mendonça em 1965. Era ele o responsável por alguns detalhes administrativos do Curso, entre o eles o Livro de Ocorrências, para o qual ele havia me nomeado escrivão por ter boa letra e redação. Com suas sobrancelhas grossas e sua cara indiática de Anthony Quinn (este na verdade um mestiço mexicano, imagino até hoje se seu verdadeiro nome não era Antonio Joaquim), Mendonça era a imagem da cordialidade.

Certos sargentos e tenentes se esmeravam, inflexivelmente, em procurar defeitos nos alunos para rebaixar seus conceitos, matéria eliminatória que podia anular os bons resultados das demais. O Sérgio Chaves já havia passado por esse pesadelo autoritário de um tenente, a quem detestava, merecidamente, pois, no CFC/64, foi o primeiro lugar em notas e reprovado em conceito graças à perseguição do insensível, segundo ele me contou.

Os instrutores e Monitores anotavam méritos e deméritos nas papeletas e depois me passavam para registrar no Livro de Ocorrências. Como também era aluno e assistia a todos os atos do curso de onde vinham os deméritos, ao recebê-las percebia muitas vezes maldade e perseguição em algumas declarações não condizentes com a realidade. Então, chamava o Mendonça e lhe explicava o que realmente vira. Ele sempre me autorizava a aliviar a anotação. Muito cabo, que continuou estudando e depois se tornou sargento metido a inflexível, não sabe até hoje dos riscos que o Mendonça correu para me autorizar a aliviá-los. Na época do acidente, também estava ainda meio doente, cursando o CFS no REsI, recém-alteado do HCEx. Ao fim do dia, fui ao RSD saber dos detalhes e dos mortos. Tive um choque com a morte do Mendonça, de quem gostava muito e com quem me identificava. Um colega me narrou, não lembro quem, que foi ajudar no socorro imediatamente após a explosão e chegou ao ferido, cujo sangue fluía abundantemente pela carótida. Tapou-lhe a artéria com a mão e este lhe disse que fosse atender os outros, que estava bem. O ferido levantou-se com a mão na carótida, deu alguns passos e caiu morto.

Zilton Tadeu Figueiredo de Campos, Pqdt 12810  1965/3  MS 1424

No que diz respeito à história revivida pelo Zilton, nada a alterar. Foi aquilo mesmo, mas não guardo mágoas. Daquela reprovação, por conceito subjetivo, tirei lições de que não se deve transigir com os deveres, mas que se pode transigir com as pessoas.

Nunca encontrei, no meu conhecimento, justificativa para o proceder de alguns oficiais e sargentos daquela quadra da minha vida. Mas, daquele infortúnio passageiro, advieram-me maneiras e procedimentos que muitas felicidades me trouxeram nos 29 anos seguintes em que permaneci no Exército.

Sérgio Chaves, Pqdt 11205  1963/6

Na realidade, os arquivos oficiais são, em sua maioria, estereotipados e frios. Jamais um documento oficial, que narra o histórico de uma entidade, consegue colocar no papel a emoção, riqueza de detalhes ou sequer narrativas dos que vivenciaram o fato.

À guisa de detalhes, três fatos marcaram em minha vida naquele episódio:

O primeiro foi a pilha” de cadáveres que vi no Hospital Carlos Chagas; o segundo, foi quando ajudava a levar um soldado para a sala de cirurgia do Hospital Barata Ribeiro. Segurando a garrafa de soro e com o braço para cima, minha gandola saiu de dentro da calça. O então Cap. Zamite da PE mandou um Sgt, também da PE, dizer-me para colocar a gandola para dentro da calça”. Não prestou! Falei para o Sgt PE dizer ao seu capitão que ordem absurda não se cumpre (Hora imprópria para se falar em uso correto de uniforme). E o terceiro, foi quando, já no HCEx e como escrivão, fui falar com o médico legista − no necrotério − sobre o Sgt Mendonça, e ele veio me atender, fumando, com o cigarro todo sujo de sangue.

“JB” Rodrigues, Pqdt 5113  1958/6  MS 1148
  
A explosão da granada

No início de março de 1966, estava conferindo e organizando a munição de dotação do Pelotão, em companhia do meu armeiro, quando ouvi uma grande explosão. Determinei ao Ariosi para que fosse verificar o que tinha ocorrido. O soldado voltou correndo e gritando: “Sargento, explodiu uma granada e tem gente morrendo!” Rapidamente fui verificar. Quando me deparei com aquele quadro horroroso, vendo companheiros despedaçados ou se arrastando pelo chão com os corpos mutilados, feridos ou atordoados, a reação imediata que senti foi de imobilidade. Entretanto, me veio logo à consciência de que eu poderia ser um daqueles acidentados, necessitando, portanto, de socorro. Voltei e fui prestar auxílio. Rapidamente chegaram viaturas que estavam disponíveis na garagem e que foram utilizadas na emergência, para transportar os feridos com a máxima urgência para o hospital. Eram colocados nessas viaturas conforme as condições e a situação permitiam e com a urgência que o caso exigia.

O acidente aconteceu, quando um Sargento estava dando uma instrução com granada de bocal. O manuseio acidental ocasionou a explosão desse artefato, resultando na morte instantânea do Sargento (caiu para trás, com o abdome dilacerado.) com mais seis soldados e outros trinta e quatro mutilados.

Mas porque explodiu a granada? Provavelmente devido a um defeito de fabricação.

Luiz Antônio Lima Vieira, Pqdt 7717, 1961/5
MS 1227  Prec 89  SL 99 e Comando 85

No dia de instrução da colocação dessa granada no cano do mosquetão (1964), estava chovendo, por isso a instrução foi realizada no dormitório da 1ª Cia. Um sargento a colocava no cano e depois a retirava. Com a granada na mão, ele retirava um dispositivo de segurança, segurando-a firmemente, dizendo que se ele a largasse, ela explodiria.

Sentado no chão, na primeira fila, atento às instruções, eu. Se desse algum problema, seguramente, eu seria um dos primeiros a morrer.

Nilo da Silva Moraes, Pqdt 11779  1964/4

Adendo final

Normalmente, a instrução com essa granada, no cano do mosquetão, era feita com uma réplica da mesma. Parece-se com a real, possui todos os dispositivos, mas não tem a carga explosiva. Naquele dia, não se sabe por qual motivo, o sargento realizou a demonstração com uma granada verdadeira. Tirou o seu dispositivo de segurança e a colocou em cima da mesa, quando apanhou a granada, com a parte frontal para baixo, impulsionou o percussor de encontro à carga explosiva ocasionando o trágico acidente. Há outra versão de que a granada, com o dispositivo de disparo armado, caiu da mesa com a cabeça da granada para baixo, explodindo na hora.


Além desses nove (9) mortos, 80 soldados, recrutas e veteranos, foram feridos e alguns mutilados seriamente.

Brevetação dos acidentados

Não quis o destino que esses bravos tivessem a sorte de tantos outros.
Vitimados pela traiçoeira explosão de uma granada, ficarão esses impossibilitados de continuarem formando em nossas fileiras.

Recebendo o brevê de paraquedistas honorários − fato inédito na História do Regimento – passaram a figurar na galeria dos nossos heróis.

O Ten-Cel. Pamplona, comandante do RSD presidiu a brevetação dos baixados, vítimas da explosão da granada. O Maj. Mauro – Relações Públicas do Regimento fez entrega de flâmulas aos novos paraquedistas no HCEx.

Militares acidentados da 2ª Cia de Fuzileiros do 1º Batalhão,
que foram brevetados paraquedistas honorários.

Sd Antônio Rufino Filho

Sd Alceu Mendes Vitorino

Sd Gilvan Correia da Silva

Sd paulo César da Silveira

Sd Deoclécio Ubiratan Pereira

Sd Remi Dias de Oliveira

Sd Reinaldo Firmino de Souza

Sd Laércio Rodrigues da Silva

Sd Jundair Castro do Prado

Sd Expedito da Silva Rodrigues

Sd Ivan Luiz Barros

Sd Marcos Abelardo Alves

Revista do Regimento Santos Dumont de 1966.


E só restou, in memorian
uma placa com seus nomes no Bosque dos Campeões...


2 comentários:

  1. Eu servi em 76 e sempre ouvi falar sobre esse terrivel acidente......

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  2. Servi no Santos Dumont em 1966,eu vi o acidente, eu era da companhia de apoio regimental que ficava perto da cadeia ,nos doamos sangue para os colegas acidentados...foi um dia difícil de esquecer.

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