Texto de Marisa Prado
Menina crescia
escutando que não adiantava mentir porque
mãe sempre sabia.
Mãe dizia
que lia na testa da Menina, e que só Mãe sabia ler testa.
Menina
tentava tapar a testa com a mão na hora de mentir. Mãe achava graça. Muita
graça. E continuava lendo assim mesmo.
Menina precisava entender como
essa coisa misteriosa acontecia. No espelho do banheiro, mentia muito em silêncio. E na testa,
nada escrito!
Aí, Menina descobriu que Mãe também mentia.
E que então não era testa - era o olho, com um brilho diferente - que
entregava a mentira.
Menina então tentava fechar o olho
com força, para esconder a Mentira. Mas nem isso resolvia, pois Mãe sempre
adivinhava.
Menina tinha era que aprender a
fingir de olho aberto que mentira era verdade. Menina tentou, tentou... e
aprendeu. Era essa a solução.
Mas, de noite, Menina ficava apertada
por dentro. Assim meio sufocada, não podia nem piscar. Com o olho muito aberto,
não conseguia dormir. Faltava ar pra Menina. Igual quando a gente fica quase
sem respirar rindo de uma cosquinha. Só que não tinha graça.
Menina – sem querer - tinha
descoberto a Consciência, uma coisa que toma conta da gente mesmo quando Mãe
não está lendo testa, nem adivinhando olho.
Menina tinha aprendido que ter que
fingir doía. E que desse jeito ia ficar muito sem graça ser gente grande. Menina desistiu de crescer. Mas não adiantava. Menina via que
agora já estava quase da altura do móvel da sala da vovó. E ficava muito
triste, o aperto apertando mais.
E de tanto que o aperto apertava,
Menina achou que fingir só podia doer tanto porque era dor sozinha.
Menina teve uma ideia, e ainda não
sabia se era ideia brilhante. Mas sabia - isso sim - que
precisava testar, pra conseguir descobrir. A ideia da Menina foi dizer para Mãe
que era difícil fingir. Menina achava ruim aprender montes de coisas sem
dividir com ninguém.
Menina falou pra Mãe que era muito
complicado e que não era nada bom ter que crescer sozinha.
Mãe abraçou muito apertado a Menina.
E, no colo tão esperado, Menina estava sendo mãe da Mãe. Menina sentiu que Mãe
estava chorando. E que Mãe ainda não tinha aprendido tudo. Mãe não falava nada,
mas uma e outra sabiam naquele abraço apertado que em Mãe também doía ser gente
grande sozinha. Nessa hora, Menina entendeu tudinho. Descobriu que só carinho é que espanta a solidão. E que dor, se dividida, fica dor menos doída. E que
aí, dá até vontade de continuar a crescer pra descobrir o resto das coisas.
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