Joel Rufino dos Santos
Lá por 1915, na terceira classe de um
navio de emigrantes para a América do Sul, um russo, Bogoloff, tentou flertar
com uma judia, Irma. Irma tinha olhos negros, sonhadores. Contemplando a linha
do horizonte, perguntou-lhe:
- Posso
saber para onde a senhorita se dirige?
- Buenos Aires. Quando
estiver um pouco estragada, irei para o Rio de Janeiro.
No Rio, começavam a desembarcar os
passageiros, pela ordem das classes, quando Bogoloff foi chamado por um
oficial:
- Como
se chama?
O intérprete traduziu. Bogoloff
respondeu em francês que não entendera. O intérprete - um tipo alto, magro, com
uma pequena barbicha alourada - se zangou:
- Você
não é russo, como não compreende russo?
Irma, que sabia francês, ajudou. O funcionário pediu que escrevesse.
- Gregory Petrovich Bogoloff.
Espiou o papel e perguntou de surpresa:
- Sua profissão?
- Professor.
O homem pareceu não se conformar.
- Você não é cafetão?
- Por quê? - fez o russo, indignado.
- Estes nomes em
"ich", em "off", em "sky", quase todos são de
cafetões. Não falha. Cafetão ou anarquista.
Bogoloff negou com veemência. Foi
liberado. Meses depois, um cabo-eleitoral apresentou Bogoloff ao senador
Sofônias, que tinha um olhar vidrado de agonizante. Recebeu prazenteiro o
russo, como todo brasileiro a quem se solicita alguma coisa. Deu uma carta de
apresentação para Xandu, ministro da Agricultura, que o recebeu prontamente:
- Ah, a sua Rússia! O que
falta ao Brasil é o frio. Tenho em casa uma câmara frigorífica, oito graus
abaixo de zero, onde me meto todas as manhãs. O frio é o elemento essencial às
civilizações. Penso em instalar grandes câmaras frigoríficas nas escolas, para
dar atividade aos nossos rapazes. Mas, enfim, quais são suas ideias?
- São simples. Por meio de
alimentação adequada, consigo porcos do tamanho de bois e bois do tamanho de
elefantes.
- Mas
como?
- O grande químico inglês Wells já escreveu algo a respeito. Conhece?
- Magnífico! E o tempo de crescimento?
- O comum. E ainda consigo a completa extinção dos ossos.
- Completa?
- Isto é, quase completa.
Bogoloff enrolou Sua Excelência um pouco mais:
- Estudei um método de
criar peixes em seco.
Procedo artificialmente, isto é, provoco o organismo do peixe
a criar para a sua célula um meio salino e térmico igual àquele em que se
desenvolveu a vida no mar. Voltou para casa, certo de que continuaria a
procurar emprego. Dia seguinte, ao abrir os jornais, fora nomeado diretor da Pecuária
Nacional.
E Irma? Não
sabemos dela.
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