Terra de Sena*
Ele era ator; ela era atriz.
Ela fazia
Como em linguagem teatral
Se diz
A dama ingênua da companhia.
E ele não representava
Assim tão mal,
Era o cínico e toda gente o
achava
Um cínico de verdade
E de uma naturalidade
De espantar.
Um dia,
Num ensaio geral da companhia,
Ele resolve a ela confessar
Toda a grande paixão que lhe vai
n´alma.
E ela, calma,
No seu papel de ingênua recatada,
Tossiu, tossiu e não lhe disse
nada.
Mas o amor ‒ deixemos de léria –
É uma coisa séria!
E no cartório de uma pretoria,
Ela, a ingênua, honesta e
recatada,
Ingressava, depois, como casada,
Na companhia
Do cínico ator feito marido.
Mais tarde,
Era sabido
Como triste verdade,
Que os dois pombinhos não se
davam bem.
Isto é,
Constava até,
E ninguém o fato desmentia,
Que a bela ingênua não se
contentava
Com uma só companhia.
E toda cheia de sinceridade,
Ao seu próprio marido confessava:
‒ Meu gênero sempre foi
variedade!
E os outros murmuravam,
Quando eles, um momento,
Da caixa se afastavam,
Que na comédia final do
casamento,
Por ela combinado
Entre cenário de uma cena escura,
Ela fizera o cínico afamado,
E ele a ingênua recatada e
pura...
*Sob este pseudônimo se tornou
conhecido na imprensa carioca Lauro Carmelino Pereira Nunes, que, entre outros
êxitos, conta o de ser pai do humorista radiofônico e autor teatral Max Nunes.
Nascido no Rio de Janeiro a 17 de maio de 1897, começou sua carreira
jornalística no D. Quixote, ao lado de Bastos Tigre, Antônio Torres, Humberto
de Campos e outros. Assumiu a direção dessa revista em 1924 a 1926. Foi um dos
fundadores de A farpa, com Jefferson; de Rio Teatro, com Celestino Silveira; de
A Máscara, com Renato Alvim; de O Trapo; de O Cartaz, com Seth; de Sua Excelência,
com Lane de Lacerda. Redator de vários jornais, alguns dos quais secretariou,
escreveu duas revistas para o teatro, Saco de Gatos, com Rubem Gill e Charleston,
com Mário Magalhães e Renato Alvim. Dois livros, Diabo a Quatro e Rua da
Amargura, reúnem parte de sua obra humorista.
(Do livro “Antologia
de Humorismo e Sátira”, de R. Magalhães Junior)
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