A tragédia de Osório
Falta à nossa literatura Shakespeare,
quem sabe Balzac, para narrar a tragédia amorosa de um grande herói da Pátria. Em
1829, o general Osório era tenente em Rio Pardo e se apaixonou por Ana, filha de
próspero fazendeiro da região.
O fazendeiro, aparentado com poderosos
do Império, opôs-se ao romance porque Osório era homem pobre. Para separar os
namorados, conseguiu que o Exército o transferisse para uma guarnição da
fronteira.
No exílio, Osório escrevia
diariamente a Ana. Jamais recebeu resposta porque as cartas eram interceptadas
pelo fazendeiro.
Mesmo sem notícia do bem-amado, Ana
manteve-se fiel. Quando o pai decidiu casá-la com um parente rico, desesperada
escreveu a Osório, pedindo que viesse buscá-la, para fugirem.
Por azar, o portador da carta adoeceu
no meio da viagem. Quando Osório recebeu o apelo, era tarde. Ao chegar em Rio
pardo, Ana havia casado na véspera.
Osório voltou para a fronteira e só
muitos anos mais tarde teve olhos para outra mulher. Quanto a Ana, adoeceu de
desgosto e faleceu antes que o indesejado casamento completasse um mês.
Pedro I e a francesa
Falta também ao Brasil um Bocaccio para
relatar a crônica galante do Imperador Pedro I. O episódio, envolvendo a
francesa Louise Saisset, cabeleireira e seu marido Antoine, dono de uma loja de
modas, é digno de figurar no Decameron.
Apaixonado pela mulher, D. Pedro ordenou
o seu camareiro, Chalaça, que chamasse o lojista ao Palácio e ali o retivesse,
sob qualquer pretexto, enquanto se divertia com Louise na residência do casal.
Antoine, metido em contrabando,
desconfiou que a conversa espichada escondesse a intenção de prendê-lo.
Aproveitou a primeira distração para fugir, chegando esbaforido em casa.
D. Pedro estava à vontade no quarto do
casal quando entrou o marido. O primeiro impulso foi jogar-se pela janela, mas
a cabeleireira o impediu, para evitar escândalo. Enfaixou-lhe a perna e contou
a Antoine que Sua Majestade – oh! que desgraça! – caíra do cavalo nas
proximidades e torcera o joelho. Socorrera Sua Majestade e o trouxera para
casa, de onde não poderia sair nas próximas 24 horas, por recomendação médica.
Naquela noite, Antoine Saisset dormiu
no sofá da sala, enquanto sua prestimosa mulher cuidava, com desvelo, do
Imperador do Brasil.
Os amores de Tiradentes
Perpétua Mineira viveu no Rio de
Janeiro ao tempo da Inconfidência. Dizem que foi amante de Tiradentes. Não deixou
rastro e não ser em crônicas de Joaquim Manoel de Macedo, que recolheu dos
mexericos de ruas. Enjeitada em
Minas Gerais , dera com os costados no Rio. Ganhou o nome
porque gostava de perpétuas, flores tidas por agourentas.
Perpétua abriu restaurante na Rua do
Ouvidor, freqüentado por Tiradentes. Os dois se apaixonaram à primeira vista.
Até aí, nenhuma novidade. Tiradentes
era chegado a amores vadios por desilusão com a única noiva que teve, Antônia
Maria Espírito Santo, que lhe foi infiel.
Quando Tiradentes foi executado em
1792, dizem que Perpétua encontrou junto da forca, manchado de sangue, o lenço
com as iniciais do alferes, que bordara para ele, havia três anos, pouco antes
de ser preso.
A história é pouco provável. Se
Perpétua Mineira teve vida real, cultivou flores e bordou lenços, não esperou
três anos para ver o bem-amado estrebuchar na forca. Com o terror imposto ao
Rio de Janeiro e à Vila Rica, para reprimir qualquer veleidade revolucionária,
logo que Tiradentes foi preso ela deu às de Vila Diogo, como se falava então.
Ou, como diríamos hoje, deu no pé, sem
flores nem lenço nem documento.
A morte de um herói
Biografia curiosa é a de um cão
vira-latas que um dia entrou no 31° Batalhão de Voluntários do Rio de Janeiro e
foi adotado pelos soldados. Ganhou o nome de Brutus. Quando estourou a Guerra
do Paraguai, recebeu o posto de mascote e seguiu para a frente de batalha.
A crônica do 31° Batalhão de
Voluntários registra a bravura de Brutus. Enfrentava os paraguaios de igual
para igual, com as armas que tinha: dentes e latidos. Ferido em ação, mesmo
assim continuou com grande garbo, mordendo e latindo para o inimigo.
Finda a guerra. Brutus voltou para o
Rio de Janeiro, coberto de glórias. Passou a ter no quartel tratamento digno de
herói. Entrava e saía à hora que bem entendia. Tinha hábitos previsíveis: carimbava
o poste mais próximo e rendia homenagem às cadelinhas da vizinhança.
É triste o destino dos velhos
soldados. Em um desses passeios, um mata-cachorros da Prefeitura do Rio de
Janeiro, incapaz de distinguir um grande herói de um mero cão vadio, jogou-lhe
carne envenenada.
Brutus morreu na rua, fulminado pela
estricnina. Seu corpo foi empalhado. Hoje é peça no Museu da Polícia Militar do
Rio de Janeiro.
(Do livro “Notas
Curiosas da Espécie Humana”, de Jayme Copstein)
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