domingo, 4 de junho de 2017

O Proleta


O Profeta de Gibran Khalil Gibran é hoje um livro universalmente reverenciado e amado. E, por sua popularidade tão grande, provocou, como outras obras-primas de seu calibre, a verve dos humoristas.

O Proleta é uma saborosa paródia desse livro famoso. São 92 páginas de besteiras solenes. Eis as mais divertidas.

As multidões congregaram-se ao pé do vale. Milhares de pessoas empurravam-se, procurando um lugar. Todos querendo ouvir a sabedoria do Mestre.
De repente, um semblante surgiu no horizonte enevoado.
‒ Já chegou! Sussurraram vozes reverentes.
Aparentava ser quase um jovem, mas calcular-lhe a idade era impossível.
Sua estatura não era elevada, mas elevados eram seus propósitos.
Enquanto o admiravam, sentou-se sobre uma pedra. E, cruzando os braços em silêncio, disse:
“Estou cansado. Mas responderei às vossas perguntas.”
No meio da multidão, um homem adiantou-se e disse:
“Poderei perguntar agora?”
O mestre acenou com a cabeça.
‒ Mestre, o que aprendeste na montanha?
O mestre respondeu: “Tudo.”

(...)

Um vestibulando perguntou:
“Mestre, podes indicar-me uma vocação adequada?”
Ele então disse:
“A vocação deve adaptar-se ao indivíduo.”
‒ Mas não tenho nem ambições, nem talento, nem habilidades, Mestre, soluçou o jovem.
E o Mestre sentenciou:
“Já pensaste em ser corretor da Bolsa de Valores?”

Então, um homem de aparência excêntrica disse:
“Fala-nos da arte.”
E ele respondeu:
“Não duvideis de que cada um de nós emergiu, um artista, do útero materno. Contudo, aquilo que é chamado de arte e está exposto no Museu de Arte Modera não é arte. Uma porcaria daquelas, meu filho de seis anos sabe fazer,” explicou o Mestre.

“E quanto ao pelo facial?” inquiriu um rapaz imberbe.
O Mestre respondeu:
“Pode-se barbear uma barba, e até mesmo pode-se barbear um bardo. Um bardo sem barba.”

E um orador disse: “Fala-nos do silêncio.”
E ele disse:
“Numa cidade do Oriente, vivia uma jovem maravilhosamente linda. Mas em toda a sua existência, não havia proferido uma palavra.
Certo dia, o califa e um grupo de cidadãos visitaram a casa de seus pais. Foram, como sempre iam, para incentivá-la a falar. Fizeram mil perguntas, mas a nenhuma delas, a jovem respondeu. Finalmente, o califa perguntou:
“Se uma macieira carregada de frutos passar despercebida pelos homens, pelos pássaros e pelas estações do ano, e todas as suas frutas apodrecerem, nunca sendo saboreadas, não seria isso um pecado?”
Foi então que os olhos da jovem se iluminaram. Ergueu a cabeça e fitou o califa.
Seus lábios macios sorriam, abertos, e, pela primeira vez na vida, ela falou.
‒ Quais foram as palavras que quebraram seu silêncio, Mestre? Inquiriu o homem.
‒ “Sua braguilha está aberta.”

Então, uma solteirona disse:
“Fala-nos da velhice.”
E ele respondeu:
“Muito tempo atrás, Thudo, o Curioso, pilotava uma pequena embarcação pelo rio Euríptico. Procurava o elixir da juventude.
Certa tarde, encontrou um arbusto estranho. Colheu algumas folhas, ferveu-as e conseguiu dois pequenos frascos da substância. E convocou os anciãos da cidade, explicando-lhes que estava pronto para vender seu elixir da juventude.
‒ Como saberemos se funciona? Perguntaram os anciãos.
Thudo exasperou-se com essas dúvidas. E enquanto olhava em silêncio, ingeriu um dos frascos. E apesar de Thudo ter vivido ainda por muitos anos, nunca mais falou com os anciãos.
‒ Então, não havia descoberto o elixir da juventude? Perguntou a solteirona, decepcionada.
‒ Não, respondeu o Mestre. Mas sua riqueza e glória estenderam-se por toda a Terra: havia inventado a Cola Thudo.”

Então, um poeta perguntou:
“E quanto aos milagres, Mestre?”
Ele respondeu:
“Eu já vi um milagre.”
‒ Que milagre foi esse? quis saber o homem.
‒ Vi uma casa onde não havia nenhum eletrodoméstico com defeito.

Então, um homem nervoso disse:
“Fala-nos da paciência.”
E ele disse:
“Se um homem não tivesse tempo para assistir a um pôr-do-sol, o sol se poria mais rápido a fim de agradá-lo?”

Então, um moribundo disse:
“Fala-nos da cura.”
E ele respondeu:
“Uma doença pode curar-se sozinha, e isso é um milagre. Assim também, às vezes, um médico pode curá-la, e isso é um milagre maior.”

Então, um encadernador de livros disse:
“Fala-nos do papel.”
E ele disse:
“O papel é a substância útil da Terra. É muito fino. Sem o papel, o homem não poderia acumular os conhecimentos. E nossos traseiros ficariam mais sujos.”

Um homem perguntou:
“E ignorância, Mestre?”
Ele então disse:
“A não ser que estejas comprando um carro usado, não há nada de mal em ser ignorante. E se fores casado, não há consolo algum em ser inteligente.”

Por favor, Mestre, por favor... uma palavra... um sorriso... um simples gesto...
O Mestre refletiu profundamente. Com uma mão sobre a porta da carruagem, fitou-os pela última vez. E com a outra mão fez o gesto.


Pérolas de Albran Kehlog Albran

“O homem nunca penetrará no espaço sideral.” (agosto 1942)

“O homem nunca penetrará no espaço sideral sem o auxílio de um foguete.” (agosto 1962)

“Um quilo de notas de cem reais pesa o mesmo que um quilo chumbo derretido. Mas vale muito mais.”

“Nunca encontrei um gigante menor que um anão, nem um anão maior que um gigante.”

“Os últimos serão os primeiros a chegarem por último.”

“Qualquer um pode ajuntar uma fortuna se tiver apenas este objetivo. É com quem busca ser pobre e acaba rico que devemos nos aborrecer.”

“O amor e o afeto são flores roxas que nascem no coração dos trouxas.”

“Um homem que não tem dez reais não tem cem reais. Um homem que não tem um real não tem dez reais. Um homem que não tem um centavo, esse ‒ coitado ‒ já era.”

“Mesmos os amigos mais leais não podem comparecer aos funerais um do outro.”

“Um pinguela ruim é melhor que nenhuma pinguela.”

“Um homem inocente de toda culpa é culpado de toda inocência. Mas não vice-versa.”

“Se não fosse pelo grande número de jornais impressos diariamente através do mundo, nossas terras estariam infestadas de árvores.” (consumo de papel)

“Mesmo que um homem adquira o automóvel mais caro do mundo, ainda deveria saber trocar um pneu.”

“Um mulher linda não tem necessidade alguma de saber trocar um pneu.”

“Mesmo o homem mais alto da terra, ao aproximar-se das Cataratas do Iguaçu se sente diminuído.”

“Tenho visto o futuro e é como o presente. Só que dura muito mais.”

“Um copo meio cheio e um copo meio vazio contêm a mesma quantidade de vinho.”




2 comentários:

  1. Como eu leio o ABC,percebi que a citação "Nunca encontrei um gigante menor..."está repetida , nada de mais, só uma observação. Gosto da variação de texto.

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  2. Se todos os meus leitores tivessem esse senso de observação, o nosso Almanaque seria muito melhor. Obrigado pelo comentário.

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