segunda-feira, 3 de abril de 2017

Dez músicas de Lupicínio Rodrigues que você precisa conhecer



Por Maria Fernanda Moraes

Quando Vinícius de Moraes escreveu que “todo poeta só é grande se sofrer” (do poema Eu não Existo sem Você, de 1957), mal sabia ele que, anos antes, em 16 de setembro de 1914, já havia nascido um compositor gaúcho que cantaria melhor que ninguém seus sofrimentos amorosos. Não é à toa que Lupicínio Rodrigues ficou conhecido como “o rei da dor de cotovelo”.

Os amores desfeitos e as dores de cotovelo sempre estiveram presentes em seus sambas-canção, conhecidos também como “samba triste” ou “samba de meio do ano” (pois eram lançados e faziam sucesso fora da época do Carnaval). Invariavelmente, as letras ligavam a sua desgraça sentimental à mulher e foram interpretados pelos maiores cantores populares do país, como Herivelto Martins, Orlando Silva, Caetano Veloso, Elis Regina e muitos outros.

Autobiográficas, suas músicas acompanhavam as fases de sua vida. Ainda jovem, um episódio amoroso influenciaria seu estilo para o resto da vida: em 1933, depois de entrar para o exército, Lupicínio foi transferido para a cidade gaúcha de Santa Maria. Foi lá que conheceu Iná, sua primeira grande paixão e a musa que inspiraria muitas composições. Entretanto, a vida boêmia do compositor fez com que Iná desistisse do noivado, depois de cinco anos de relacionamento.

No livro “Foi Assim” (Editora L&PM), Lupicínio Rodrigues Filho conta que o pai não tocava instrumentos, apenas fazia sons com uma caixa de fósforos. E na hora de compor tinha um método peculiar: assobiava. Lupicínio costumava dizer que não era músico ou compositor, assumia-se apenas como “um boêmio profissional”.

Lupicínio morreu aos 59 anos, com problemas no coração. Com cerca de 150 canções, muitas delas ficaram famosas pelas vozes de cantores prestigiados. Acompanhe algumas:

01. “SE ACASO VOCÊ CHEGASSE”

Foi com esse samba, em 1938, que Lupicínio alcançou seu primeiro grande sucesso, em parceria com Felisberto Martins e gravado na RCA Victor por Ciro Monteiro. Em 1957, foi regravado por Elza Soares e se transformou numa das mais importantes músicas do repertório dela (a música está no disco Se Acaso Você Chegasse, que faz parte do box Negra).

A letra do samba refere-se ao episódio em que Lupicínio conta a Heitor Barros que estava tendo um caso com uma ex-namorada do amigo, sugerindo que mantivessem a amizade apesar disso.

02. “NERVOS DE AÇO”

Em 1947, Francisco Alves fez a primeira gravação desse samba-canção, que se tornaria um clássico da música popular brasileira. Mas foi na voz de Paulinho da Viola que a música arrebatou as gerações mais recentes (pode ser encontrada no disco Argumento).

Essa é uma das canções inspiradas por Iná, a noiva que desistiu do casamento com Lupicínio por conta da vida boêmia dele. Os versos de “Nervos de Aço” nasceram quando Lupicínio viu a ex-noiva casada com outro homem.

03. “VINGANÇA”

Em 1951, a cantora Linda Batista gravou dois sambas de Lupicínio na RCA Victor: “Dona divergência”, com Felisberto Martins, e “Vingança”. Este último é um dos grandes exemplos de suas canções ao estilo dor de cotovelo e rendeu ao compositor grande projeção. Posteriormente, a música ficou famosa também na voz de Maria Bethânia (no disco Memória da Pele).

Na história da letra, Mercedes (também conhecida como Carioca), então namorada de Lupicínio, tenta seduzir um empregado dele, que conta ao patrão o caso. Ele rompe com ela e, logo em seguida, no carnaval, os amigos dele a veem num bar e, sem saberem do rompimento, perguntam por Lupicínio. A moça se põe a chorar copiosamente, o que o inspira a escrever a música logo após saber do episódio.

04. “NUNCA”

Depois da letra de “Vingança”, outro episódio com a Carioca também virou canção. Trata-se de uma resposta negativa às tentativas da moça de reconquistar Lupicínio. Em certo momento, o compositor diz que “nem se Deus mandar” ele faria as pazes com ela. Segundo dizem, a moça havia levado uma foto dele para um pai de santo fazer um trabalho.

Na década de 1980, a canção voltou a ganhar notoriedade com a regravação de Zizi Possi.

05. “ESSES MOÇOS (POBRES MOÇOS)”

Outro grande exemplo de uma bela dor de cotovelo, mas desta vez destinada a um amigo. A canção ficou famosa na voz de Francisco Alves, e Lupicínio Rodrigues a escreveu ao saber que seu grande amigo e parceiro Hamilton Chaves iria se casar. Segundo contam, Lupicínio achava o companheiro ainda moço para se casar – ele estava com 22 anos. O conselho, entretanto, não foi ouvido, mas se tornou uma canção popular na época.

06. “FELICIDADE”

Essa é uma das canções mais populares de Lupicínio: “Felicidade foi-se embora e a saudade no meu peito ainda mora”. Em 1947, o Quarteto Quitandinha foi o primeiro a gravá-la. Depois, na década de 1970, virou hit com a regravação de Caetano Veloso.

Segundo o diretor e dramaturgo Artur José Pinto, que estudou a vida de Lupicínio para fazer Lupi, o Musical, há um episódio em que Lupicínio encontrou Caetano num bar em Porto Alegre depois de um show na cidade. Caetano ainda estava com a maquiagem do show e causava estranheza nas pessoas ao redor. Lupicínio então o acolheu e passaram a madrugada toda conversando.

07. “CADEIRA VAZIA”

Imortalizada na voz de Elis Regina, a letra dessa canção fala da história de uma moça que saiu de Porto Alegre para ir atrás de outras oportunidades no Rio de Janeiro. Como as coisas não andaram bem, ela precisou retornar ao Sul. Na volta, o ex-namorado Lupicínio a acolheu. Mas o sofrimento da separação foi tanto que ele não conseguiu mais amá-la como antes.

08. “ZÉ PONTE”

Orlando Silva foi um dos grandes intérpretes de Lupicínio. Em 1947, o compositor deu a Orlando duas canções: “Brasa” e “Zé Ponte”.

Na letra de “Zé Ponte”, Zé é um alter ego do compositor, e a cabocla presente na letra é Iná. A canção é a primeira que ele compôs para ela, ainda antes de namorarem e antes da desilusão.

09. “EXEMPLO”

É uma das muitas canções de Lupicínio que ganharam vida na voz de Jamelão, grande parceiro e intérprete das dores do compositor gaúcho.

A música foi feita para comemorar os dez anos de casamento de Lupicínio e dedicada à sua mulher Cerenita. A esposa e o filho também aparecem em outra música, “Nossa Senhora das Graças”.

10. “HINO OFICIAL DO GRÊMIO”

Até a pé nós iremos, para o que der e vier. Mas o certo é que nós estaremos com o Grêmio, onde o Grêmio estiver”.

Apaixonado por futebol e torcedor fanático do Grêmio, é de Lupicínio a letra e melodia do hino oficial do clube, composto em 1953 em um guardanapo de papel num restaurante, segundo contam. A história é que ele e mais alguns amigos aguardavam o horário do bonde para ir até o estádio assistir ao jogo, mas souberam que o serviço estava em greve. Tiveram, então, que seguir a pé até o estádio, e lá, vendo seu time jogar, o compositor teve a ideia da letra. A canção venceu um concurso em comemoração ao cinquentenário do time e depois se tornou o hino oficial.


(Do Blog da Livraria Saraiva)





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