segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

O sangue de Badaró



O médico italiano Giovanni Battista Libero Badaró chegou ao Brasil em 1820 e radicou-se em São Paulo, onde instalou seu consultório. Homem de temperamento expansivo, não teve dificuldades para fazer logo boas amizades na nova terra, especialmente com políticos, jornalistas e intelectuais. Influenciado pelas ideias liberais, que reclamavam uma constituição para o Brasil, Badaró engajou-se na luta, fundando o jornal O Observador Constitucional.

Com a deposição do rei Carlos X, em outubro de 1830, que marcou o fim do absolutismo na França, os liberais brasileiros, entusiasmados, intensificaram a campanha pela constituição. Os ânimos foram ficando exaltados. Estudantes e populares passaram a fazer ruidosas manifestações contando com o apoio do jornal de Líbero Badaró.

Na noite de 20 de novembro de 1830, quando saía da casa de um amigo, ele foi atacado por dois homens encapuzados e ferido mortalmente a golpes de faca*. Amigos e companheiros de luta quiseram chamar um médico, mas Badaró não permitiu:

“Sou médico. Sei que os ferimentos são muito sérios. Sinto que estou entrando em agonia. Aproveitem melhor o seu tempo descobrindo quem fez isso, para que outros não venham a ser assassinados. Aqui morre um liberal; mas não morre a liberdade.”

(Do livro “Novas Crônicas Pitorescas da História do Brasil,
de Eloy Terra)

*Na verdade, ele foi morto a tiros de pistola.


O jornalista Libero Badaró no seu leito de morte,
aquarela de Hércules Florence

*****

Giovanni Battista Líbero Badaró nasceu Laigueglia, Itália, em 1798 e morreu em São Paulo, em 21 de novembro de 1830, foi jornalista, político e médico italiano radicado no Brasil.

Assassinato de Libero Badaró aumenta pressão
para saída de Dom Pedro I


No dia 21 de novembro de 1830, um assassinato traiçoeiro desestabilizou ainda mais o frágil governo do imperador Dom Pedro I. Em São Paulo, morria, vítima de um atentado, Giovanni Battista Libero Badaró, jornalista, político e médico italiano radicado no Brasil. Nascido na Itália, na cidade de Laigueglia, em 1798, ele se mudou para os trópicos em 1826. Em solo brasileiro, tornou-se um liberal e viveu na cidade de São Paulo, onde atuava como médico e dava aulas gratuitas de matemática. Fundou o jornal O Observador Constitucional, em 1829, o que não era bem visto pelos absolutistas. Em São Paulo, alguns estudantes do Curso Jurídico fizeram uma campanha contra o governo monárquico. Os manifestantes tornaram-se criminosos para o ouvidor Cândido Ladislau Japiaçu e foram processados. O Observador Constitucional fez campanha em favor dos acusados e atacou Japiaçu. Desafeto de Japiaçu, Libero Badaró sofreu um atentado no dia 20 de novembro, às 22h, quando voltava para a sua casa na rua São José (hoje rua Líbero Badaró). Suas últimas palavras antes de morrer foram “Morre um Liberal, mas não morre a Liberdade”.

No dia seguinte, ele faleceu e sua frase virou símbolo da liberdade de imprensa. Sua morte ganhou grande repercussão, com milhares de pessoas no seu enterro e mais de 800 tochas acesas. O principal responsável pelo assassinato foi um alemão, chamado Stock, que se escondeu na casa de Japiaçu. O alemão foi preso, mas Japiaçu, apesar de processado, acabou absolvido. Segundo historiadores, a ordem para matar Badaró pode ter partido de Dom Pedro I. O fato complicou ainda mais a situação política do imperador, criticado por sua postura autoritária. No ano seguinte, no dia 7 de abril de 1831, Dom Pedro I abdicou do trono e mudou-se para Portugal, deixando a coroa para o seu filho, Dom Pedro II, de apenas 14 anos.

(Do Blog History)

O crime

Líbero Badaró se aproximava de sua casa entre 10 e meia e 11 horas da noite de 20 de novembro de 1830, quando viu dois homens sentados nas proximidades. Na rua escura, iluminada apenas pela lua cheia, perguntaram-lhe se era o dr. João Baptista Badaró. Diante da resposta afirmativa, disseram que vinham de parte do ouvidor. Badaró mal teve tempo de dizer que não era amigo de Japi-Assú quando sentiu no ventre o impacto do tiro de pistola. A bala causou ferimentos internos incuráveis que lhe provocaram uma agonia dolorosa por quase 24 horas, tempo suficiente para que, na presença de testemunhas respeitadas na cidade, fosse interrogado pelo juiz José da Silva Merciana, cujos “autos da devassa” detalhadamente elaborados permitiram à polícia capturar alguns suspeitos.

Ao juiz, Badaró declarou que não conhecia os atacantes, mas pelo sotaque sabia que eram alemães e, indagado se tinha suspeita de quem eram os responsáveis, não hesitou em apontar como mandante o desembargador-ouvidor Japi-Assú. Era mais do que uma suspeita, pois até o escrivão da Ouvidoria, Amaro José Vieira, em seu depoimento posterior ao crime, disse tê-lo advertido diversas vezes que escutara de seu chefe afirmações de que pretendia matá-lo. O que o jornalista não sabia era que seu assassinato foi cuidadosamente planejado e sua execução – segundo pesquisa de Argimiro da Silveira, publicada na Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo em 1890 –, começou numa chácara da Freguesia do Braz, quando ao tenente Carlos José da Costa, vindo do Rio para matá-lo, foi indicado o alemão Henrique Stock para acompanhá-lo, identificar e executar a vítima. Badaró faleceu em consequência de hemorragia interna, às 10 horas de 21 de novembro de 1830.

*Japi-Assú – grafia de jornais da época do crime.

Carlos Alves Müller,
especial para a Gazeta do Povo - 19/11/2010


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