quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Conto e Fábula do Veríssimo

Conto de fadas para Mulheres Modernas 


Era uma vez, numa terra muito distante, uma linda princesa, independente e cheia de autoestima que, enquanto contemplava a natureza e pensava em como o maravilhoso lago do seu castelo estava de acordo com as conformidades ecológicas, se deparou com uma rã. Então, a rã pulou para o seu colo e disse:

– Linda princesa, eu já fui um príncipe muito bonito. Mas, uma bruxa má lançou-me um encanto e eu transformei-me nesta rã asquerosa. Um beijo teu, no entanto, há de me transformar de novo num belo príncipe e poderemos casar e constituir lar feliz no teu lindo castelo. A minha mãe poderia vir morar conosco e tu poderias preparar o meu jantar, lavarias as minhas roupas, criarias os nossos filhos e viveríamos felizes para sempre…

…E então, naquela noite, enquanto saboreava pernas de rã à sautée, acompanhadas de um cremoso molho acebolado e de um finíssimo vinho branco, a princesa sorria e pensava:

– Eu, hein?… nem morta!

(Luís Fernando Veríssimo)

A solução


O Sr. Lobo encontrou o Sr. Cordeiro numa reunião do Rotary e se queixou de que a fábrica do Sr. Cordeiro estava poluindo o rio que passava pelas terras do Sr. Lobo, matando os peixes, espantando os pássaros e, ainda por cima, cheirando mal.

O Sr. Cordeiro argumentou que, em primeiro lugar, a fábrica não era sua, era de seu pai, e, em segundo lugar não podia fechá-la, pois isto agravaria o problema do desemprego na região, e o Sr. Lobo certamente não ia querer bandos de desempregados nas suas terras, pescando seu peixe, matando seus pássaros para assar e comer e ainda por cima cheirando mal.

– Instale equipamento antipoluente, insistiu o Sr. Lobo.

– Ora, meu caro, retrucou o Sr. Cordeiro, isso custa dinheiro, e para onde iria meu lucro? Você certamente não é contra o lucro, Sr. Lobo! disse o cordeiro, preocupado, examinando o Sr. Lobo atrás de algum sinal de socialismo latente.

– Não, não! disse o Sr. Lobo. Mas isto não pode continuar. É uma agressão à Natureza e, o que é mais grave, à minha Natureza. Se fosse à Natureza do vizinho…

– E se eu não parar? perguntou o Sr. Cordeiro.

– Então, respondeu o Sr. Lobo, mastigando um salgadinho com seus caninos reluzentes, eu serei obrigado a devorá-lo, meu caro.

Ao que o Sr. Cordeiro retrucou que havia uma solução:

– Por que o senhor não entra de sócio na fábrica Cordeiro e Filho?

– Ótimo, disse o Sr. Lobo.

E desse dia em diante não houve mais poluição no rio que passava pelas terras do Sr. Lobo. Ou pelo menos, o Sr. Lobo nunca mais se queixou.

(Luís Fernando Veríssimo. Santinho. Porto Alegre, L&PM.)


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