sábado, 24 de setembro de 2016

Fábulas Modernas


O Grilo Professor


Lá em tempos muito remotos, num dia dos mais quentes do inverno, o Diretor da Escola entrou de surpresa na classe em que o Grilo dava aos Grilinhos sua aula sobre a arte de cantar, precisamente no momento da exposição em que explicava que a voz do Grilo era a melhore a mais bela entre todas as vozes, pois se produzia mediante o adequado esfregar das asas contra as costas, enquanto os pássaros cantavam tão mal porque teimavam em fazê-lo com a garganta; evidentemente o órgão do corpo humano menos indicado para emitir sons doces e harmoniosos.

Ao escutar aquilo, o Diretor, que era um Grilo muito velho e sábio, concordou várias vezes coma cabeça e se retirou, satisfeito de que na Escola tudo continuava como nos seus tempos.


(Do Livro “A Ovelha Negra e outras Fábulas”, de Augusto Monterroso)


O grande sábio e o imenso tolo


Por um acaso do destino, um velho e sábio professor e um jovem e estulto aluno se encontraram dividindo bancos gêmeos num ônibus interestadual. O estulto aluno, já conhecido do sábio professor exatamente por sua estultície, logo cansou o mestre com seu matraquear ininterrupto e sem sentido. O professor aguentou o quando pôde a conversa insossa e descabida. Afinal, cansado, arranjou, na sua cachola sábia, uma maneira de desativar o papo inútil do aluno. Sugeriu:

‒ Vamos fazer um jogo que sempre proponho nestas minhas viagens. Faz o tempo passar bem mais depressa. Você me faz uma pergunta qualquer. Se eu não souber responder, perco cem pratas. Depois eu lhe faço uma pergunta. Se você não souber responder, perde cem.

‒ Ah, mas isso é injusto! Não posso jogar esse jogo – disse o aluno, provando que não era tão tolo quanto aparentava ‒, eu vou perder muito dinheiro! O senhor sabe infinitamente mais do que eu. Só posso jogar com a seguinte combinação: quando eu acertar, ganho cem pratas. Quando o senhor acertar, ganha só vinte.

‒ Está bem – concordou o professor – pode começar.

‒ Me diz, professor – perguntou o aluno, o que é que tem cabeça de cavalo, seis patas de elefante e rabo de pau?

O professor, sem sequer pensar, respondeu:

‒ Não sei; nem posso saber! Isso não existe.

‒ O senhor não disse se devia existir ou não. O fato é que o senhor não sabe o que é – argumentou o aluno – e, portanto, me deve cem pratas.

‒ Tá bem, eu pago as cem pratas – concordou o professor pagando ‒, mas agora é minha vez. Me diz aí: o que é que tem cabeça de cavalo, seis patas de elefante e rabo de pau?

‒ Não sei – respondeu o aluno. E, sem maior discussão, pagou vinte pratas ao professor.

Moral: A sabedoria, nos dias de hoje, está valendo 20% da esperteza.


(Do livro “Fábulas Fabulosas”, de Millôr Fernandes)


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