sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Histórias de Cyro Monteiro



Cyro Monteiro

Em 1938, sempre que chegava um navio de guerra da Marinha do Brasil, em Porto Alegre, nas horas de folga, principalmente à noite, os marinheiros iam à rua Cabo Rocha, hoje Professor Freitas de Castro, no bairro Azenha, que, na época era a zona do baixo meretrício.

Uma pequena explicação aos amigos de todo o país: Rio Grande é o principal porto marítimo do Rio Grande do Sul. Os navios entravam no estado por esse porto, subiam pela Lagoa dos Patos, chegando ao rio (estuário) Guaíba e ao porto de Porto Alegre.

Voltando ao assunto, num dos locais mais frequentados da Cabo Rocha (herói Guerra dos Farrapos, foi o revolucionário que comandou o primeiro combate com os imperiais na Ponte da Azenha, 1835) era o Cabaré do Galo, onde havia música ao vivo com um pequeno regional: violão, cavaquinho e pandeiro.

Corta para o Rio de Janeiro, então Distrito Federal, um dos marinheiros, que gostava de música e também era músico, ficou impressionado com uma canção que ouvira num cabaré gaúcho. Procurou um jovem cantor iniciante sem nenhum sucesso gravado, Cyro Monteiro, e disse a ele:

‒ Vou te presentear com um samba gaúcho.

Cyro, incrédulo:

‒ E desde quando gaúcho faz samba?

O marinheiro, então, canta para ele o samba “Se acaso você chegasse”.

Cyro grava a música, que se torna sucesso em todo o país, alavanca a sua carreira de cantor e lança, para todo o Brasil, o grande Lupicínio Rodrigues.

Se acaso você chegasse

(Lupicínio Rodrigues e Felisberto Martins)

Se acaso você chegasse
No meu chatô e encontrasse
Aquela mulher que você gostou.
Será que tinha coragem
De trocar nossa amizade
Por ela que já lhe abandonou?

Eu falo porque essa dona
Já mora no meu barraco,
À beira de um regato
E de um bosque em flor.
De dia me lava a roupa.
De noite me beija a boca
E assim nós vamos vivendo de amor.

A história do samba acima foi real. Lupicínio consultou a um amigo de farra sobre a possibilidade de manter um caso com a mulher dele já que ela havia se interessado por ele. O amigo, apesar de sentir que havia sido traído, consentiu. Perdeu a mulher, mas continuaram a amizade.

Cyro Monteiro nasceu no Rio de Janeiro, em 28/5/1913, na Estação do Rocha, era apelidado de “Formigão” pelos amigos e também era conhecido como “O Cantor das Mil e uma Fãs”. Grande torcedor do Flamengo, era respeitado até mesmo pelos simpatizantes de times adversários. Morreu no Rio, em 13/7/1973, aos 60 anos. Foi sepultado no Cemitério São João Batista, “ao som da marcha do Flamengo, cantada por integrantes da torcida jovem, coberto com a bandeira do clube e da Estação Primeira de Mangueira”.

Presente de grego

Esta história foi contada por Cyro num programa antigo da TV Educativa.

Cyro e Chico Buarque eram muito amigos. Cyro diz a Chico que gostaria de gravar uma música sua que não fosse muito longa, pois sabia que as letras dele eram extensas e difíceis de decorar. Pediu, ainda, que a palavra mais longa fosse “oi”.

No nascimento da primeira filha do Chico com a triz Marieta Severo, que nasceu, em 1969, em Roma (Itália)* Silvia Severo Buarque de Hollanda, a sua primogênita, tendo como padrinho Vinicius de Moraes. Cyro, flamenguista doente, presenteou a filha do compositor, fluminense apaixonado, com uma camisa do Flamengo.

Chico fez, para o inusitado presente a seguinte música:

Ilmo. Sr. Cyro Monteiro ou Receita pra virar casaca de neném


Chico por Carlnhos Muller

Amigo Cyro,
muito te admiro,
o meu chapéu te tiro,
muito humildemente.

Minha petiz
agradece a camisa
que lhe deste à guisa
de gentil presente.
Mas, caro nego,
um pano rubro negro,
é presente de grego,
não de um bom irmão.

Nós separados
nas arquibancadas,
temos sido tão chegados
na desolação.

Amigo velho,
amei o teu conselho,
amei o teu vermelho,
que é de tanto ardor.

Mas quis o verde,
que te quero verde
é bom pra quem vai
ter de ser bom sofredor.

Pintei de branco o teu preto
ficando completo
o jogo de cor.
Virei-lhe o listrado do peito
e nasceu desse jeito
uma outra tricolor

Dizem que, apesar de todo o esforço do pai, a Silvinha, filha do Chico, tornou-se flamenguista. Chico, na amizade, chamou de Cyro de “aliciador de menores”.

* Chico Buarque foi “convidado” pelos militares a deixar o Brasil, por isso ele foi morar um tempo na Itália.



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