A raposa e as uvas
Passava certo dia uma raposa perto
de uma videira. Apesar de normalmente nunca se alimentar de uvas, pois se trata
de um animal carnívoro e não vegetariano, sua atenção foi chamada pela beleza
dos cachos que reluziam ao sol. Fenômeno estranhíssimo, uma vez que,
geralmente, toda fruta cultivada é revestida por uma fina camada protetora de
inseticida e dificilmente pode refletir a luz solar com tal intensidade. Sendo
curiosa e matreira, como toda raposa matreira e curiosa, aproximou-se para
melhor observar a videira. Os cachos estavam colocados muito acima de sua
cabeça, e o animal (sem insulto) não teve oportunidade de prová-los, mas, sendo
grande conhecedor de frutas, bastou-lhe um olhar para perceber que as uvas não
estavam maduras.
‒ Estão verdes ‒ disse a raposa,
deixando estupefatos dois coelhos que estavam ali perto e que nunca tinham
visto uma raposa falar.
Seu comentário foi ainda mais
espantoso, uma vez que as uvas não eram do tipo moscatel e sim pequenininhas e
pretas, podendo facilmente ser confundidas, à primeira vista, com jabuticabas.
Note-se por este pequeno detalhe o profundo conhecimento que a raposa tinha de
uvas, ao afirmar com convicção que apesar de pretas, elas eram verdes. Dito
isto, afastou-se daquele local.
Horas depois, passa em frente à mesma
videira outra Canis vulpes (nome mais
sofisticado do mesmo bicho), mais alta do que a primeira. Sua cabeça alcança os
cachos e ela os devora avidamente.
No dia seguinte ao frutífero festim, o pobre bicho acorda com lancinantes dores estomacais. Seu veterinário, chamado imediatamente, diagnostica uma intoxicação provocada por farta ingestão de uvas verdes.
Moral:
Nem todas as raposas são despeitadas.
O lobo e o cordeiro
Um pequeno cordeiro, bem desavisado,
bebia água numa bica, calmo e relaxado. Um lobo aparecendo, não se sabe donde,
já que numa cidade lobo não se esconde, a fim de devorar o cordeirinho amável,
foi logo dizendo num tom desagradável:
‒ Porco, você está pondo a
boca na torneira e isso para mim é uma tremenda sujeira. Depois eu estou a fim
de beber desta água. Falo isso no duro, sem raiva e sem mágoa.
Foi a vez de
o cordeiro acanhado dizer:
‒ Seu lobo, eu não estou pondo a boca pra beber e mesmo
que assim fosse, como o senhor pensa, informo que não tenho nenhuma doença.
‒ Pode ser ‒ disse o lobo. ‒ Mas ontem no morro, teu pai disse que eu era um lobo cachorro.
‒ O
senhor se enganou ‒ disse o outro assustado. ‒ O meu pai faleceu já no ano passado.
‒ Então foi tua mãe ‒ disse o lobo gritando, e o cordeiro falou quase desculpando:
‒ Eu
garanto. Mamãe? É impossível, coitada. Teve enfarte e morreu quando foi
tosquiada.
Respondeu o
tal lobo sem titubear:
‒ Bom,
não interessa! Só sei que vou te jantar!
Pegou o cordeirinho nervoso e
aflito, preparou pro jantar e comeu ele frito.
Moral:
Mesmo nas mais agitadas megalópoles, onde às vezes falta água,
o lobo
come o cordeirinho.
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