domingo, 15 de novembro de 2015

Que p... é essa?



Zeca Baleiro*

– E aí, como foi de feriado? Foi à praia?
– Fui, mas foi um horror. Só confusão.
– Como assim?
– Bom, minha amiga emprestou a casa dela no Guarujá, lá fomos nós. Sol a pino, céu azul, parecia que ia ser um belo fim de semana... Já entrando na rodovia, um incidente.
– Bateram o carro?
– Não, uma blitz. Um cara nos parou, disse que tinha um farol quebrado.
– E tinha?
– Uma lasquinha só.
No uniforme dele tava ­escrito “agente da mobilidade urbana”.
 – Que p... é essa?
 – Isso mesmo que você ouviu. Guarda nada, agente da mobilidade urbana.
 – Multou?
 – Não, Arnaldo argumentou com ele, falou que raspou na garagem, que ia consertar, mas esqueceu... Enfim, safou-se.
– Ainda bem, ninguém merece, né?
– Aí, mal chegamos lá, o irmão do Arnaldo aparece, bêbado.
– Xi!
– Chamou meu marido de lado e começou o maior blábláblá... Perguntou se ­podia ficar lá na casa também... E já foi pedindo ­dinheiro emprestado, disse que tava “negativado”.
– Que p... é essa?
– Tava duro, quebrado, mas pra sensibilizar o irmão usou palavra bonita.
– Vixe!
– Aí fomos pra praia. Com um sol daqueles... ­Resolvi cair no mar.
– Delicioso?
– Nada. Já veio um salva-vidas e me disse que a praia tava com baixo nível de “balneabilidade”.
– Que p... é essa?
– É assim tipo... a praia não tá boa pra banho, sabe?
– Mas precisa de um ­palavrão desse?
– Pois é. Aí resolvemos ir a um restaurante de frutos do mar. Você sabe, Arnaldo é doido por caranguejo... Lá fomos nós.
– Bom?
– Uma delícia, mas...
– Mas o quê?
– Clara, minha caçula, passou mal, teve uma intoxicação. Lá fomos todos pro pronto-socorro.
– Meu Deus, que zica, hein?
– Pois é. Tomou soro, o doutor deu remedinho e pediu pra eu passar uma semana fazendo um tal de “recordatório alimentar”.
– Que p... é essa?
– É tipo um relatório de tudo que come. Pra saber se foi só uma coisa eventual ou se ela tem um problema alérgico grave.
– Que coisa!
– Aí falei, não, quero um café. Fui a um café e pedi um expresso.
– Um café nessas horas é tudo, né, amiga?
– Aí vem o garçom e me pergunta: “Pode ser um café ‘restrito’, senhora?”
– Que p... é essa?
– Ah, é um tipo de café metido a besta.
– Tomou?
– Tomei. Mas nessa altura eu já tava p da vida.
– Foi pra casa?
– Não, lá era um cybercafé, tinha o check-in de uma viagem pra fazer, resolvi fazer logo... Alguma coisa tinha que dar certo naquele sábado.
– E deu?
– Coisa nenhuma. Fui tentar imprimir os dados e nada.
– O que aconteceu?
– Apareceu na tela do computador: “impressão inibida”.
– Que p... é essa?
– E eu lá sei? Só sei que não consegui imprimir p... nenhuma.
– Que dia, hein?
– É, mas chega, não quero mais falar disso. E seu feriado, como foi?
– Tranquilo. Mas tomei uma decisão.
– Qual?
– Vou fazer um curso.
– Nossa, que bom. Qual?
– É um curso de “análise fundamentalista”.
– Que p... é essa?
– Ah, é um curso de análise econômica. Preciso voltar a estudar, senão me acomodo.
– Nome mais terrorista!...

In Revista Isto É, 2 de março de 2011

* Zeca Baleiro é cantor e compositor

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