Uma piada
O diálogo que se segue foi extraído
do livro de Rosa Nepomuceno (1999)e mostra o tipo de humor que prevalecia na
década de 1920, marcado, sobretudo, pela ingenuidade.
- Ô cumpadi. Sabe que lá na
minha cidade fizeram uma torre tão arta, mas tão arta, que tiveram que virá a
ponta dela?
- Pra
quê, cumpadi?
- Pra
lua pode passa, porque tava enganchada!
- Ô cumpadi! Na minha terra
tem um trem tão ligeiro, tão ligeiro, que quando ocê entra nele já tem que
compra o bilhete de vorta!
- Que mentira, cumpadi! Trem ligeiro tem na minha
terra! O sujeito brigou com o chefe da estação, foi dá um tapa nele e acerto no
chefe da outra estação, distante 30 quilômetros.
Contribuição à história das novelas no Brasil
Antes mesmo de inaugurar a era das
novelas radiofônicas com a lacrimejante Em busca da felicidade, a Rádio
Nacional vinha, desde sua inauguração, em 1936, levando ao ar, em meio à sua
programação normal, pequenas "cenas", que os locutores da época
chamavam de esquetes. O primeiro esquete apresentado pela PRE-8, Namorado capaz
de tudo..., era da autoria de Genolino Amado, e dele tomaram parte Celso
Guimarães e Amélia de Oliveira, que assim podem ser considerados os primeiros
radioatores da emissora. O diálogo entre os dois atores, repleto de
reticências, metáforas e juras de amor, é absolutamente inverossímil e
risível, mormente o seu fim, digno de um programa humorístico. Na verdade, o
esquete de Genolino Amado constitui um exemplo esclarecedor de como eram
escritos os textos teatrais e radiofônicos na época. A coisa funcionava assim:
quanto mais rebuscadas, aflitivas e heroicas eram as declarações de amor, mais
sinceras pareciam ser as palavras do declarante. Para provar que amava
sinceramente a outra, o sujeito dispunha-se a tudo, até passar por sacrifícios
físicos. O texto a seguir, que é a reprodução literal do esquete Namorado capaz
de tudo..., vale, portanto, como um documento duplamente histórico: testemunha
um fato na evolução da Rádio Nacional e acentua um traço da nossa trajetória
cultural.
Namorado capaz de tudo...
Ele - Ah! Meu amor... Por ti, seria capaz de dar até a minha
vida.
Ela - Oh! Paulo... Gostas tanto de mim, de verdade? Não estás
exagerando?
Ele - Não! Não é exagero... Eu
sinto que o teu amor me dá forças sobre-humanas. Sinto que sou capaz de
realizar prodígios por tua causa. O que pedires, eu farei... Queres aquela
estrela que está brilhando no céu? Se quiseres, irei buscá-la...
Ela - Não é preciso tanto, Paulo. Para que quero eu uma
estrela?
Ele - Dê-me, então, qualquer
oportunidade para eu provar a grandeza da minha paixão. Queres que eu vá ao
fundo do mar, trazendo a mais linda pérola do oceano?
Ela - Não... Não precisa molhar
a tua roupa. Prefiro que vás a uma joalheria e me tragas um colar. É mais
prático...
Ele - Mas eu quero arriscar a
minha vida, passar por grandes perigos, resistir a muitos sacrifícios, a fim de
demonstrar como é ardente o sentimento que me inspiras. Se me pedires para
galgar essas montanhas inacessíveis que azulam a distância, subirei por aqueles
penhascos e se rolar lá de cima, ficarei contente. Morrerei feliz, porque a
morte pelo amor é melhor do que a vida.
Ela - Oh! Como és romântico!
Ele - Não é romantismo. É
apenas sinceridade, devotamento do meu coração. Queres que eu desafie o mundo
inteiro por tua causa? Desafiarei!
Ela - Para quê, Paulo? O mundo
já tem tantas preocupações, tantas trapalhadas! Não convém complicá-lo ainda
mais com esses desafios. Eu não preciso de provas. Já sei que gostas muito de
mim. Já tenho a certeza.
Ele - Mas eu quero demonstrar
que meu amor é diferente. Não é como esses amores comuns... Amores covardes,
que não sabem ter as dedicações profundas. Queres que eu corte esta mão?
Ela - Não! De maneira alguma. Quero apenas que peças a minha
mão em casamento.
Ele - Bem... Bem... Essa coisa
de casamento fica para depois. Não se deve estragar essas horas de poesia com
essas idéias burguesas de matrimônio. Faremos dos nossos sonhos de beleza, das
nossas ilusões cor-de-rosa, dos nossos ideais tão puros e tão lindos...
Ela - Mas, Paulinho... Nem só
de romantismo vive uma mulher... Falemos de coisas mais simples do nosso
futuro, do ninho que iremos construir...
Ele - Está bem. Mas isso fica
para mais tarde... Por enquanto deixe que minh'alma navegue nas ondas
cristalinas da poesia amorosa...
Ela - Pois, então, vá navegando...
Ele - Eu quisera ser um Colombo para te oferecer uma nova
América.
Ela - É muita coisa, Paulo. Uma nova América daria muito
trabalho.
Ele - E que tem isso? Por ti,
não me incomodaria de enfrentar riscos tremendos, gostaria de afrontar as vagas
revoltas dos mares nunca d'antes navegados. Por ti, desafiaria dragões.
Atravessaria desertos maiores do que o do Saara. Lutaria com as feras selvagens
das florestas. Não há obstáculos que não possa vencer por tua causa. Para quem
ama de verdade, não existe impossível. Manda buscar aquela estrela... Eu irei!
Manda-me combater na guerra da Espanha. Serei um herói. Pede-me para que eu
seja o homem. Com a tua inspiração, venceria a minha candidatura à Presidência.
Por ti, para te ver e principalmente para te ver satisfeita e confiante em meu
amor, farei tudo, tudo, que é possível.
Ela - E por que então não vieste me ver ontem à noite?
Ele - Ah! Choveu...
Ela - Ah! Choveu... Foi só por isso?...
Ele - E acha pouco? Não estava disposto a apanhar um
resfriado...
Ela - Ah! É assim? Tu te ofereceste para apanhar uma estrela no céu, uma pérola no fundo do mar, mas não podes apanhar um resfriado... E ainda dizes que o teu amor é ardente... Não, mentiroso! O que tens é muito sangue-frio...
O programa retratava uma sala de aula
improvisada na casa da professora Dona Teteca (interpretada por Lígia Sarmento)
e de seu marido(Renato Murce). Os alunos não podiam ser mais impagáveis:
Manduca (Lauro Borges), Seu Ferramenta (Castro Barbosa) e Coronel Fagundes
(Brandão Filho). A produção e o texto do programa eram de Renato Murce.
- Manduca!
- Sinhô.
- Dê o
exemplo de uma coisa escura.
- Mas
bem escura?
- Isso
mesmo. Escura, bem escura, vamos.
- Bem escura... É o
Leônidas, contrastando com o Maneco, dentro de um túnel, chupando jabuticaba,
os dois vestidinhos só com uma tanguinha preta.
(Leônidas da Silva, que atuava no
Flamengo, e Maneco, meia-direita do América, eram afro-descendentes).
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