Stanislaw Ponte Preta
Era uma vez uma papagaia... ou
antes, era uma vez uma senhora que vivia sozinha, era muito católica e não
tinha bicho nenhum em casa.
Como era uma senhora solteirona, ficava até um pouco puxado
para o tarado o fato de não se dedicar a um bicho. É aqui que entra a papagaia.
Um dia a senhora solteirona sem
nenhum bicho em casa foi visitar uma família conhecida. Chegou lá, viu uma
papagaia num poleiro, cantarolando. “Que bonito papagaio”, ela disse. “Não é
papagaio. É papagaia”, disseram para a senhora. E, como tivesse se interessado
muito, a família ofereceu a papagaia a ela.
Tá na cara que a senhora
solteirona sem nenhum bicho em casa adorou o oferecimento e carregou a papagaia
para casa. Mas aí é que foi chato. A papagaia era levadíssima. Mal chegou à sua
nova casa, começou a dizer palavrões homéricos, a citar trechos completos da
última peça do Nélson Rodrigues, a recitar o diálogo de La dolce vita e a dizer
coisas horríveis sobre seus desejos incontidos.
A senhora ficou horrorizada e já
ia mandar a papagaia embora quando chegou um vizinho para visitar. Soube do
drama e disse: “Não há de ser nada. Eu tenho lá em casa dois papagaios
comportadíssimos. Tão comportados que passam o dia rezando. Eu boto a papagaia
perto dos dois e pode ser que ela se manque e fique igual a eles”. A senhora
agradeceu muito e a papagaia foi.
O vizinho colocou a papagaia num
poleiro entre os dois papagaios. Assim que ela se viu na parede, começou a
engrossar outra vez. Foi aí que um dos papagaios abriu um olho e ficou
observando. Quando ficou convencido de que a papagaia era mesmo da pá virada,
cutucou o outro que continuava rezando e disse:
− Pare de rezar, companheiro,
que, ou muito me engano, ou as nossas preces acabam de ser atendidas.
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(Stanislaw Ponte
Preta era o pseudônimo do cronista Sérgio Porto
nascido em 11 de
janeiro de 1923 e morto em 29 de setembro de 1968)
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